REMUNERAR “FUNCIONÁRIO FANTASMA” É CRIME? E A PRÁTICA DA ‘RACHADINHA’?
Por Felipe Bochi Damian
Advogado – OAB/RS 115.259
Email: felipe.damian@jobimadvogados.com.br
Imagine o seguinte cenário hipotético: o prefeito de uma pequena cidade nomeia um parente seu para exercer cargo em comissão (cc) na Secretaria Municipal de Saúde. O parente, embora nunca tenha exercido efetivamente o trabalho – era um “funcionário fantasma” -, recebeu durante meses a remuneração financeira do erário pelo cargo que ocupava.
A questão é: nesse caso, o prefeito do município cometeu crime de responsabilidade (DL 201/67, art. 1º, I[1])?
De acordo com o entendimento do Superior Tribunal de Justiça (min. rel. Nefi Cordeiro, AREsp 1162086): “pagar remuneração ao servidor público não constitui desvio ou apropriação de renda pública, tratando-se, pois, de obrigação legal, ainda que seja questionável a contratação de parentes do prefeito”.
Desse modo, é cristalino que o pagamento de remuneração a funcionário público devidamente nomeado, por si só, não enseja o crime de responsabilidade do prefeito, pois, embora o agente nomeado não exerça o cargo, o respectivo pagamento é obrigação legal do erário. Porém, tanto prefeito quanto o funcionário público poderão responder por infração disciplinar e/ou improbidade administrativa – que importará perda do cargo ou função pública, restituição de valores, multa, proibição de recebimento de incentivos fiscais, entre outros.
Mas, e se o funcionário público (agente nomeado) estiver repassando os valores ao prefeito (agente nomeante)? Se comprovado que o “funcionário fantasma” retinha os valores financeiros pagos pelo cargo para, em momento posterior, repassá-los (de forma integral ou em parte) ao agente que o nomeou ao cargo, configura-se o crime de peculato-apropriação, previsto no art. 312 do Código Penal – essa prática é conhecida como ‘rachadinha’ (nesse sentido: REsp 1723969).
Portanto, o “funcionário fantasma” que recebe os valores do erário e não exerce efetivamente o respectivo cargo não pratica fato típico (crime) – muito embora possa sofrer sanções cíveis e administrativas. Porém, caso reste demonstrado que houve desvio da verba pública, como no caso da prática da ‘rachadinha’, existe a possibilidade dos agentes nomeante e nomeado sofrerem, além das sanções administrativas e cíveis, a sanção penal correspondente.
[1] Art. 1º São crimes de responsabilidade dos Prefeitos Municipal, sujeitos ao julgamento do Poder Judiciário, independentemente do pronunciamento da Câmara dos Vereadores: I – apropriar-se de bens ou rendas públicas, ou desviá-los em proveito próprio ou alheio;
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