O ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO PENAL: REQUISITOS NECESSÁRIOS PARA A SUA REALIZAÇÃO
Por Felipe Bochi Damian
Advogado – OAB/RS 115.259
Email: felipe.damian@jobimadvogados.com.br
Algumas modificações do controverso pacote “anticrime” (Lei nº 13.964/19) entraram em vigor no começo de 2020. Entre elas, o novo artigo 28-A inseriu o Acordo de Não Persecução Penal (ANPP) no ordenamento jurídico pátrio. É bem verdade que a previsão de soluções consensuais (acordos) no Código de Processo Penal, em determinada medida, custou a se tornar realidade, pois a tendência de ampliação dos espaços negociais na justiça criminal brasileira não é novidade.
Sendo assim, analisaremos, conforme a previsão legal do art. 28-A, quais são os requisitos necessários para a composição do ANPP pelo Ministério Público e indiciado:
Primeiramente, o investigado terá que manifestar a intenção de confessar (formal e circunstancialmente) a prática da infração penal ao Ministério Público, mas não é toda e qualquerinfração penal que possibilita a composição do acordo. Conforme disposto no caput art. 28-A, ainfração penal não poderá ser cometida com violência ou grave ameaça e deverá ter penamínima inferior a 4 (quatro) anos.
Importante frisar que, de acordo com o § 1º do referido artigo, para a aferição da pena mínima cominada ao delito serão consideradas as causas de aumento e diminuição aplicáveis ao caso concreto. Isto é, as circunstâncias favoráveis ou prejudiciais ao réu (como, por exemplo, o concurso de agentes) deverão ser consideradas, a fim de verificar se a pena mínima aplicável ao caso concreto passa, ou não, dos 04 (quatro) anos. Nada de pena cominada em abstrato, como no caso dos Juizados Especiais Criminais (JECRIM).
Preenchidos tais requisitos objetivos supra, o acordo poderá ser proposto pelo Ministério Público – e o verbo poder é essencial para que possamos compreender que oferecer proposta de acordo não é obrigação, mas sim uma decisão discricionária do parquet. Em outras palavras, o suspeito não possui um direito subjetivo ao acordo (mesmo que lhe seja mais benéfico), pois o órgão acusador não tem o dever de fazer proposta.
E quais as medidas que o indiciado terá que cumprir para a realização desse acordo? Dependerá de um ajuste prévio entre as partes (MP e indiciado), que irão ajustar cumulativa ou alternadamente as seguintes condições:
- reparação do dano ou restituição da coisa à vítima;
- renúncia voluntária a bens e direitos provenientes do crime;
- prestação de serviço à comunidade ou a entidades públicas, pagamento de prestação pecuniária; e
- o cumprimento de outra condição indicada pelo Ministério Público, desde que proporcional e compatível com a infração penal imputada.
Ajustadas as medidas, a homologação do acordo será realizada por juiz e precedida de audiência específica em que o investigado – acompanhado de seu defensor – será ouvido, a fim de checar sua voluntariedade na composição do acordo e a respectiva legalidade do ANPP (preenchimento dos requisitos objetivos do art. 28-A).
O juiz, conforme disposição legal, possui mera função fiscalizatória-homologatória no ANPP – ou seja, não participa da composição do acordo e, em tese, não possui poder para interferir e impor cláusulas. Porém, de acordo com o § 5º do art. 28-A, o juiz poderá considerar inadequadas, insuficientes ou abusivas as condições dispostas no acordo, devolvendo os autos ao Ministério Público para que a proposta de acordo seja reformulada, desde que haja concordância do investigado e seu defensor. Em outros termos, o juiz somente devolverá o ANPP ao Ministério Público para que este reformule a proposta com a concordância do investigado e do seu defensor.
Ainda, além do preenchimento de todos os requisitos objetivos já mencionados acima, existem hipóteses em que o acordo não poderá ser proposto (§ 2º do art. 28-A) – sob pena de manifesta ilegalidade. São elas:
- se for cabível transação penal de competência dos Juizados Especiais Criminais, nos termos da lei (crimes com pena máxima abstrata igual ou inferior a 02 anos);
- se o investigado for reincidente ou se houver elementos probatórios que indiquem conduta criminal habitual, reiterada ou profissional, exceto se insignificantes as infrações penais pretéritas;
- ter sido o agente beneficiado nos 5 (cinco) anos anteriores ao cometimento da infração, em acordo de não persecução penal, transação penal ou suspensão condicional do processo; e
- nos crimes praticados no âmbito de violência doméstica ou familiar, ou praticados contra a mulher por razões da condição de sexo feminino, em favor do agressor.
Os requisitos acima expostos são, em suma, aqueles previstos para a propositura e homologação do acordo de não persecução penal, conforme recente redação do art. 28-A do Código de Processo Penal. Estão em curso interessantes discussões sobre voluntariedade da propositura do ANPP por parte do Ministério Público e a sua respectiva aplicação retroativa. Porém, por ser um dispositivo ainda tímido, creio que os Tribunais Superiores levarão algum tempo para criar jurisprudência sólida sobre a aplicação do ANPP.
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